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30.12.10

2010 em revista, parte terceira: tudo o que cabe entre 'música' e 'badalhocas'

Porque cabe muita coisa entre música e badalhocas, deixo-vos com aquilo que estive mesmo mesmo mesmo quase a colocar no blog mas que não coloquei porque tinha que jogar computador/ver as Tardes da Júlia/não fazer nada... Aproveito para desejar um feliz 2011 a todos os meus clientes e amigos, não me olvidando de mencionar que o bacalhau hoje está com 15% de desconto e se encontra no corredor 9.



Seriado viral de 2010: Na casa D'Este Senhor



Veículo promocional para a cerveja Tagus, a série Na casa D'Este Senhor é um produto que poderia estar perfeitamente num canal por cabo. Valores de produção cuidados, um argumento surreal e um humor muito peculiar, capaz de arrancar gargalhadas de incredulidade a qualquer um. Seguimos ao longo dos episódios a vida na casa d'Este Senhor, anteriormente conhecido como Bondage nos tempos das Noites Marcianas. Coabitando consigo temos Adolfo o jardineiro, Sam The Kid o produtor musical, Maniche o gato e Tuxa a musa.

"Eu acho que a palavra musa vem do Latim. E a palavra foi constituída 'MUSA', pronto, porque, 'eles' exigem muito um M. Porque pronto, 'eles' têm... Usava-se muito há uns anos, 1920, 1925, musa. O M vem de Maria, o U vem de Umbelina, o S de Simone e o A vem por exemplo de Antónia, ou de António, e foi por isso que 'eles' definiram em latim, 'MUSA'."

Os episódios podem ser seguidos aqui. E, para os fãs mais acérrimos, aconselho vivamente o blog do Maniche, onde podemos ver também pérolas extra como o karaoke da Tuxa ou a história da Victoria Bacon, vocalista das Super Géreles. É bom demais.


Filme de 2010: How to Train Your Dragon



Este ano não vi muitos filmes de 2010, ainda ando a ver os bons de 2008 e a consumir todos os do Woody Allen, pelo que ainda não me actualizei devidamente com o que foi saindo. How To Train Your Dragon ganha por ter sido o único filme que vi no cinema este ano, e o meu primeiro em 3D. A história não é nova, um jovem tem problemas de aceitação na sociedade em que se insere, mas através da persistência consegue salvar o dia e provar aos outros que temos direito a sermos diferentes. Só que com Vikings e Dragões. No entanto, as cenas de voo, em 3D, estão fabulosas. É mesmo como se fossemos nós a conduzir o dragão pelos ares, tal a sensação de imersão que o efeito nos dá. Brilhante.

E sim, ainda não vi o Machette nem o Scott Pilgrim (a BD anda a sair traduzida em Português, já agora). Talvez lá para 2012.


Esquema para sacar dinheiro de 2010: Pulseiras Power Balance



De vez em quando lá surge um esquema para roubar dinheiro a quem se deixa iludir por marketings e modas. Lembro-me das pulseiras para o reumático que o meu tio usava era eu um catraio, lembro-me de ver toda a gente a andar com Crocs, a peça de calçado mais horrível alguma vez criada "porque assim o pé respira", e dentro de uns anos irei certamente recordar com carinho dos 30 euros que muitas pessoas que conheço deram para comprar uma pulseira, porque subitamente todos passámos a precisar de algo que nos equilibre, sem auxílio a um bocado de plástico com um adesivo colado estávamos o tempo a cair no chão, lembram-se?

O marketing é uma ferramenta do demónio, realmente. Criam-se necessidades virtuais nas cabeças das pessoas, e quando o embuste é descoberto já estão os responsáveis bem longe, a acender charutos com notas de 100€, banhando-se em banheiras de hidromassagem, na companhia de senhoras que não se fazem baratas. Os Espanhóis, sendo Espanhóis, ainda os multaram em 15 000€, mas o ser humano gosta mesmo de ser enganado, e daqui por uns tempos surgirá mais um artista a inventar uma nova necessidade nas mentes da carneirada. O Mundo é dos espertos.


Banda Desenhada de 2010: Axe Cop




Axe Cop é a colaboração de Ethan, um autor de banda desenhada de 29 anos, e Malachai, o seu irmão de 6 anos. Ethan desenha, Malachai escreve. Todos nós já tivemos 6 anos e certamente teremos uma vaga ideia de como a nossa imaginação corria livremente antes de nos serem impostos conceitos e preconceitos. É essa a essência de Axe Cop, a pureza da imaginação sem qualquer filtro. Obviamente, Axe Cop é só estupidez atrás de estupidez, e é isso que torna a série tão deliciosa. Estamos perante um polícia que enverga um machado mágico que utiliza para decapitar todos os maus, e uma paleta de personagens secundárias alucinante, incluíndo o seu parceiro Flute Cop que evolui naturalmente primeiro para dinossáurio, depois para abacate e finalmente para fantasma, Sockarang com as suas meias boomerang, Baby Man e a sua baby family, e o meu favorito, Vampire Man Baby Kid, que é meio vampiro adulto, meio vampiro bebé e meio vampiro criança no meio. Uma delícia!

A morada desta loucura é axecop.com. Se se vão meter nisto, recomendo que comecem pelo primeiro episódio (aqui), ou que adquiram sem leitura prévia o livro editado muito recentemente pela Dark Horse, contendo uma aventura de proporções tão gigantescas que nem sequer coube no site.


Vieira, o eterno candidato



Mais uma vez, a corrida de Vieira ao poder ficou adiada. Desta vez eram as presidenciais. Das 7500 assinaturas necessárias, foram entregues 7700, mas dessas somente 3300 estavam válidas. Ou seja, só 3300 assinaturas passaram pelas respectivas Juntas de Freguesia a fim de serem autenticadas. Muito pouco, para o apoio e carinho que os seus fãs dispensam ou dizem dispensar às aventuras políticas de Manuel João. A bem da verdade, não foi sentido desta vez um grande empenho da parte do Candidato em motivar os seus discípulos. Lembro-me da grande campanha de 2000, onde Vieira passeou pelo seu Portugal Alcatifado, fazendo comícios, participando em programas televisivos, mobilizando as massas. Desta vez também tivemos comícios, mas a uma escala mais pequena. Culpamos também os Portugueses de 2010 que são diferentes de 2000, quando agora basta fazer um "like" no Facebook para se "aderir" a uma causa. As pessoas desejam mudança mas nada fazem para a obter, não se mexem para nada, não querem saber. As coisas aparecem feitas, sempre foi assim, e agora que o comodismo está no auge, ainda mais será.

Culpo-me a mim também, por não ter não só enviado a minha assinatura, como também não ter recolhido as de algumas dezenas de preguiçosos que, tendo um proponente que fizesse o trabalho todo por elas (ir à Junta, enviar as assinaturas pelo correio), teriam também contribuído. Vontade não me faltou, aliás como não tem faltado em tudo o que é Vieirista, mas faço parte da Política local e fui desaconselhado a envolver-me... Não é uma desculpa muito válida, mas neste caso, nenhuma é.


Pelo menos, no meio de tudo isto, ainda rendeu um livrinho parecido ao do Camarada Mao!



O Livro Rosé de Sua Santidade o Camarada Presidente Vieira, compilando frases, textos e teorias do Candidato, e que será certamente o equivalente à Bíblia para o Partido Muita Fixe que eventualmente será criado em torno de Vieira! Eu já tenho o meu para levar para os comícios!


Prémio Especial Zé Cabra para juventude promissora:



VAMES AGOURAAAAAA! É AGOURAAAAAAA!


Bill Murray fez 60 anos


Cinco filmes preferidos de Bill Murray:

1-Lost in Translation
2- The Life Aquatic With Steve Zissou
3- The Royal Tenenbaums
4- Ghostbusters
5- Groundhog Day

Parabéns Bill Murray e um feliz 2011 para ti também!

8.11.10

Livros: Escritos Pornográficos

Foi editado em Portugal este ano um pequeno mas peculiar livro de Boris Vian, uma estreia em terras lusas e por isso mesmo motivo de atenção: Escritos Pornográficos.



Boris Vian viveu uma curta mas intensa carreira no Mundo literário até à hora do seu falecimento, há 50 Primaveras transactas. Quer pela sua maneira muito pessoal de ver as coisas na sua escrita em nome próprio, quer pela violência e sexualidade explícita na escrita de seu pseudónimo Vernon Sullivan, Vian esteve sempre dentro de uma nuvem de polémica que tanto lhe deu notoriedade como serviu para arrastar o seu nome na lama. Estranha-se saber porque um livro com este título vindo deste autor tenha demorado tanto tempo a chegar a Portugal.

Para quem já teve a oportunidade de conhecer as várias encarnações de Vian não vai encontrar em Escritos Pornográficos grande novidade. Temos cinco poemas espirituosos, um ensaio divertido a espaços mas de interesse reduzido e um conto verdadeiramente explícito. Entre notas sobre os textos, um prólogo, as ilustrações de Pedro Vieira e uma biografia exactamente igual à apresentada noutras obras do autor, o verdadeiro sumo é bom mas sabe a pouco. Quem conhece a obra de Vian sairá desiludido, quem não conhece também não é em Escritos Pornográficos que vai ficar a conhecer. Resumindo, este é um livro divertido e interessante para mentes badalhocas e apreciadores do autor, mas peca por ser curto e grosso mas não dar duas voltas ao pescoço.

28.9.09

Livros: Clássicos da Humanidade

Chamada de atenção para a iniciativa do jornal Expresso. O semanário apresenta uma oportunidade de ouro para adquirir uma parte substancial da Colecção Clássicos da Humanidade a um preço muito convidativo.



A colecção Clássicos da Humanidade consiste na adaptação de obras literárias de grande valor para o Português actual. Já vem surgindo pela editora Sá da Costa há uns tempos, e agora é reunida pelo Expresso em edição de bolso e pelo preço simbólico de 1 euro cada (mais preço do jornal). Cá fora pelas livrarias e papelarias estão já os dois primeiros volumes. Peregrinação, de Fernão Mendes Pinto, brilhantemente adaptado pelo Mestre Aquilino Ribeiro. Os Lusíadas, de Luís de Camões, só não leva selo de sacrilégio por apresentar o sub-título Contado às crianças e lembrados ao povo.

No mês de Outubro ainda teremos a oportunidade de ler Viagens de Gulliver (dia 3), A Odisseia de Homero (dia 9), a fantástica História Trágico-Marítima (um dos livros preferidos do meu pai, dia 17) e a Eneida de Virgílio (dia 24). 6 livros 6, todos eles épicos, todos eles adaptados, por 5 euros mais preço de jornal e seus habituais 30 quilos de suplementos. Ideal para fomentar o gosto pela leitura nas mentes mais jovens e impressionáveis.

12.8.09

Livros: Uma Pequena História do Mundo

Destaque para o ternurento livro Uma Pequena História do Mundo, de E. H. Gombrich, Austríaco por nascimento, Britânico por naturalização e cadáver por falecimento.



Uma Pequena História do Mundo consiste na narração factual e condensada da História do planeta Terra, desde a Pré-História até aos tempos modernos. Escrito a pensar num público infanto-juvenil, este livro consegue fugir a esses escalões etários, sendo uma leitura fresca e interessante para públicos de todas as idades. Sempre apresentando o ponto de vista do autor, para o bem (Uma Pequena História do Mundo chegou a ver a sua publicação suspensa pelos Nazis por o considerarem "demasiado pacifista") e para o mal (no capítulo final, escrito já posteriormente à edição original, o autor desculpabiliza-se por ter sido parcial em alguns capítulos, chegando mesmo a identificar os mesmos), por aqui aprendemos sobre a origem dos dias da semana, dos feitos de Alexandre, o Grande, da batalha de Maratona, da cavalaria, da Idade das Trevas e da luz que surgiu no Renascimento, até ficar tudo novamente escuro com o fumo das fábricas da Revolução Industrial, contrastando com o vermelho das guilhotinas da Revolução Francesa.


O que encanta neste livro é a capacidade de Gombrich para nos narrar os acontecimentos como um avôzinho conta uma estória de embalar aos netos, de forma divertida, descontraída, simples e acima de tudo, cativante! Para ser lido em voz alta às crianças da família!

29.5.09

Livros: Contra a Felicidade

"Não há alegria sem mágoa, o sol cheio de vida não existe sem a lua cravada de cicatrizes" Eric G. Wilson



A felicidade. A felicidade! A felicidade... O que é ser-se feliz? A felicidade é encontrar um ponto estável num mundo em constante mutação. Um contrasenso. A felicidade genuína não existe! Ou existirá, porventura, mas momentaneamente. Um sorriso pode fazer um momento melhor, mas não um mundo melhor. Porque enquanto o homem não saber aceitar que a melancolia faz parte do seu âmago, e que é uma emoção que não deve ser abafada mas sim libertada, nunca seremos verdadeiramente pessoas felizes.

Citação:

"Tentar ser sempre feliz é, necessariamente, reprimir a tristeza inevitável. Entoando com persistência: «Eu estou bem», «eu estou bem», eles empurram a melancolia para o fundo. Aí, no inconsciente, os sentimentos sombrios vão apodrecendo. Claro que não permanecerão para sempre nas profundezas, regressando sempre sob formas monstruosas - em comportamentos neuróticos como a constante lavagem ou limpeza das mãos, em pesadelos perversos e devaneios indecorosos."

E é este o tema central deste livro, oportunamente intitulado Contra a Felicidade com o sub-título Em Defesa da Melancolia, de Eric G. Wilson. Um livro que, apesar por pecar por se dirigir imensas vezes à realidade Norte-Americana, de onde provém o autor, defende o estado melancólico como algo natural e até essencial para a plenitude da condição humana. E, através de exemplos práticos, demonstra como um estado de melancolia potencia um surto enorme de criatividade nas pessoas, da estranha vitalidade que alguém sente quando finalmente deixa de lutar contra a tristeza que o vai minando. Não é à toa que o melhor disco dos Smashing Pumpkins se chame Mellon Collie & The Infinite Sadness, nem que Moby Dick esteja impregnado de melancolia até à medula óssea da grande baleia branca. É da melancolia que nasce a vida, é preciso aceitá-la como parte de nós, é preciso não recalcar as emoções, amar as pessoas que amamos, chorar pelas pessoas que perdemos, perdoar as pessoas que nos desiludem, procurar que as pessoas que desiludimos nos perdoem. Viver sem fantasmas. Porque não existe nada de errado em nos sentirmos melancólicos. Um livro de auto-ajuda diferente dos outros, que nos leva a aceitar a nossa natureza, através de uma emoção conotada como "negativa". Eu, que na vida pessoal sou uma pessoa divertida e até algo energética, aprendi a aceitar e abraçar a melancolia como uma parte muito importante do meu ser. Recomendável, até para quem se acha feliz.



Confidência: não é à toa que às vezes escrevo o conteúdo mensal do meu blog num dia, aproveito os dias que estou na merda e canalizo a energia para o meu blog. Não que o Contra seja grande coisa, mas a ideia que quero passar é que, quando se sentirem em baixo, canalizei as emoções para algo que vos dê prazer fazer. Irá confortá-los com uma felicidadezinha...

7.11.08

Livros: O crocodilo que voa

"Está para sair um livro com entrevistas suas... Esse livro é uma merda! Isso é uma aldrabice. É bom para andar por essas pequenas editoras."



O crocodilo que voa é um compêndio de entrevistas feitas a Luiz Pacheco, escritor libertino, pederasta, ex-presidiário, bisexual e uma das personagens mais ricas do universo literário Português. Um livro que reúne 16 anos de entrevistas, acompanhando Pacheco de lar de idosos em lar de idosos. Um livro onde o entrevistado conta as aventuras sexuais com magalas à beira-Sado, fala das suas ex-mulheres que o enganaram e que enganou e da quantidade de filhos que não lhe fala nem quer saber dele. Um livro onde um senhor de idade se queixa da quantidade alarmante de doenças com que padece. Um livro onde o entrevistado discorre sobre os seus pares, desde os plágios de Fernando Namora e as invejas de Vergílio Ferreira, aos assédios de Natália Correia à sua esposa aquando da estadia de Pacheco no Limoeiro. Um livro onde se fala da qualidade superior do disco "O Bicho", de Iran Costa!

A grande maioria das entrevistas são hilariantes, pela sinceridade de Pacheco e pela sua sagaçidade mental que não se viu diminuída pelo passar dos anos. Quase como uma biografia, O crocodilo que voa conta uma história de Portugal recente e alternativa, pelo olhar e língua afiada do Divino Marquês. Imperdível.

22.5.07

Livros: O Principezinho

Li O Principezinho pela primeira vez tinha eu 8 anos. Achei a história divertida, mas não lhe prestei muita atenção. Na altura gostava mais do Tio Patinhas do que de livros com muitas letras. Voltei a ler O Principezinho aos 16 anos, e fiquei aprisionado pela mensagem do livro. Passei a comprar O Principezinho compulsivamente, de tal forma que a senhora da livraria da minha terra já sabia ao que vinha quando entrava pela porta a dentro com uma nota de 5 contos ganhos merecidamente pelos meus serviços como servente de pedreiro, o meu primeiro emprego num belíssimo historial de exploração patronal. Ofereci O Principezinho a toda a gente que conhecia: Aos meus pais, ao meu irmão, aos meus amigos, às minhas namoradas, ao cão da vizinha. Cheguei a traduzir passagens do livro para Inglês (estupidez minha, já que este livro é o segundo mais traduzido no mundo, atrás da Bíblia) em cartas dirigidas a uma Belga que acabou por se tornar "só amiga". E no entanto, nunca possuí uma cópia daquele que é o meu livro favorito de sempre. Até que anos depois, já a febre d'O Principezinho passada e a mensagem esquecida, a minha mãe resolve oferecer-mo. "Deste este livro a tanta gente, é justo que o tenhas também", disse-me ela. Este post é escrito com a Dona Elisete Baratizo no pensamento. Obrigado, mãe!

23.4.07

Livros: Woody Allen Prosa Completa

Gostava de escrever sobre outros géneros literários. Gostava de conseguir escrever sobre o Moby Dick e o Guerra e Paz. Gostava de escrever sobre o Kafka (um dia aventuro-me). Gostava de escrever sobre a gloriosa Laranja Mecânica do Anthony Burgess e de como o livro está a anos-luz do filme (para melhor). Mas o que acontece é que ultimamente só tenho lido livros assumidamente humorísticos, com potencial humorístico mesmo sem o ser (alguém leva a sério o livro do Rambo?), sobre humor e infantis. É o que compro e o que mais prazer me tem dado a ler. Eu, que até sou considerado um tipo com mau feitio. Os meus colegas de trabalho apelidam-me carinhosamente de "besugo trombudo".



Posto isto, e visto que hoje se comemora o Dia Mundial do Livro, este mês levam com um livro de humor escrito por um realizador de cinema, e para o mês que vem levam com um livro infantil. Para não quebrar muito a rotina.



O livro deste mês chama-se Woody Allen Prosa Completa, e foi escrito por Woody Allen, que é o senhor que se encontra na fotografia abaixo:







Woody Allen Prosa Completa reúne num só volume as três colectâneas de humor do afamado músico/cineasta/actor/escritor/dramaturgo: Para Acabar de Vez com a Cultura (Getting Even, de 1971), Sem Penas (Without Feathers de 1975) e Efeitos Secundários (Side Effects, de 1980), num total de 52 histórias curtas, peças de teatro, correspondência fictícia e entradas enciclopédicas fantasiosas.



Impregnada pelo neurótico non-sense que caracteriza Mestre Allen, esta antologia deve ser obrigatoriamente digerida em doses muito pequenas, de modo a se poder apreciar com calma todos os pormenores e devaneios presentes em cada texto.



Destaco, em Para Acabar de Vez Com A Cultura, a peça de teatro A morte chama, em que um senhor engana a morte vencendo-a num jogo de cartas. Em Efeitos Secundários, o destaque vai para O homem mais superficial do Mundo, um relato sobre um indivíduo que evita a todo o custo visitar um seu amigo moribundo no hospital, até ao dia em que o faz e se apaixona por uma enfermeira, passando a visitar o amigo mais por egoísmo do que por compaixão. Em Sem Penas, ressalva para Se os impressionistas tivessem sido dentistas, um troca de correspondência entre o afamado dentista Vincent Van Gogh e o seu irmão e patrocinador Theo.



Deixo-vos com um excerto, também de Sem Penas, de um texto intitulado Fábulas fantásticas e animais míticos:



O grande «roe»



O grande roe é um animal mitológico com cabeça de leão e corpo de leão, mas sem serem do mesmo leão. O roe tem fama de dormir mil anos para depois surgir em chamas, especialmente se estava a fumar ao deitar-se.



Diz-se que Ulisses acordou um roe aos seiscentos anos, mas este mostrou-se apático e mal-humorado, pedindo-lhe que o deixasse ficar na cama mais duzentos anos.



O aparecimento de um roe é geralmente considerado coisa nefasta e costuma anteceder um tempo de miséria ou a notícia de uma festa de sociedade.

13.3.07

Livros: Rambo, a Fúria do Herói II

Rambo. John Rambo. O homem. O soldado. A máquina de guerra. O herói de 3 blockbusters (com mais um a caminho). Rambo, o ícone! Rambo, o duro! Rambo, o... livro?



"Quando Rambo deixou as sombras do hangar, com o corpo musculoso em silhueta, devido à luz do Sol, abrindo a extremidade do tubo e preparando-se para praticar, Murdock virou-se para Trautman e abanou a cabeça, duvidoso.

- Coronel, tem a certeza de que ele não está ainda perturbado pela guerra? Aquela piada que ele fez acerca do pára-quedas. E ele está realmente... Eu nem Acredito. Quero dizer, tenho mesmo as minhas dúvidas... Mais interessado num arco e flechas do que num lança-granadas ultra-sofisticado. Não podemos dar-nos ao luxo de envolver alguém que possa desvairar, sob pressão, em território hostil.

- Pressão? - Trautman pareceu ter ficado estupefacto. - Pensei que tinha estudado a ficha dele, que sabia tudo sobre ele. Ele é o melhor soldado de combate que eu já vi. Mesmo em Bragg, durante o treino, era óbvio que ele seria um sucesso. Um génio. Tem um instinto para a luta e, neste momento, um único desejo: ganhar uma guerra que outros o forçaram a perder.

- Coronel, vá lá, o senhor desaponta-me. Espero que não vá voltar àquela velha piada de o Governo segurar os braços dos militares para não poderem ganhar.

- Houve mentiras. E morreram bons homens por causa disso. E outros bons homens estão ainda prisioneiros, por causa disso. E Rambo... Bem, se ganhar agora significar que tem de morrer também, ele morrerá. Sem medo. Sem ressentimentos. Isso, mais do que qualquer outra coisa, torna-o especial. Desvairar, sob pressão? Nem pensar. Porque, Murdock, aquilo a que você escolheu chamar território hostil...

- Sim? Que tem?

- Ele chama-lhe lar."

Ao que parece, David Morrell escreveu há muitos anos atrás um livro, de seu nome First Blood. O livro retratava o regresso de um antigo soldado Norte-Americano da guerra Vietnamita ao seu país de origem, e a sua impossibilidade de se readaptar. O livro, aclamado no ano da sua edição, terminava com a única solução possível para um homem treinado apenas para a guerra e sem qualquer hipótese de fuga numa sociedade em paz: a sua própria morte.

First Blood foi adaptado ao cinema. Sylvester Stallone encarnou a personagem do soldado falhado, John Rambo. James Cameron realizou. O filme foi um sucesso. A personagem principal não morreu no final como devia ter acontecido. Tinha de haver uma sequela. David Morrell, incapaz de parar a máquina de Hollywood, procurou encontrar uma solução alternativa para manter os direitos sobre a sua personagem, entretanto morta-viva tal como um zombie. A sequela do livro (e do filme) dava pelo título Rambo, A Fúria do Herói II.

O problema principal reside essencialmente aí. Rambo havia morrido no livro. Se David Morrell tivesse tido juizo, não tinha vendido os direitos de First Blood para Hollywood. A sequela funciona como um remendo com pouca cola e convicção.

"Depois da sua guerra privada contra o xerife de uma pequena cidade, Rambo está na prisão; quando o coronel trautman, seu ex-comandante, lhe propõe uma missão que para a maioria dos homens seria suicídio, Rambo aceita.

Terá de penetrar na selva do Vietname e encontrar camaradas que ainda lá estão a ser torturados. Não deve trazê-los de volta, mas apenas fotografá-los. Não se pode vingar.

Para Rambo, a primeira missão é difícil. A segunda, impossível..."


Rambo, o livro, é tão esquecível quanto o segundo filme. E então, qual é o intuito de trazer este tema à baila? Simples!

O SACANA DO LIVRO FICA MUITO BEM NA ESTANTE, CARAÇAS!

Verdade. Primeiro, quantos livros do Rambo existem? E quantas pessoas se deram ao trabalho de adquirir um livro do Rambo em Portugal? Segundo, os níveis de comicidade que uma passagem aleatória deste livro atingem quando lidos na casa de banho. Terceiro, qual não é a moçoila que não fica impressionada pela virilidade de um gajo que tem um livro do Rambo na prateleira?

Rambo, A Fúria do Herói II não será um bom livro... Na verdade, nem sei se uma coisa destas possa ser considerada livro. Mas lá que dá um ar másculo à estante e impressiona as babes, lá isso é indiscutível! Veja-se o seguinte diálogo, totalmente verídico (coff, coff) entre a minha pessoa e uma amiga de circunstância:

- "Ai, ai, ai, tantos livros! O menino bem comportadinho gosta tanto de ler, não é?"

- "Sim, mas repara... Tenho o livro do Rambo..."

- "Possui-me já aqui neste chão imundo, minha besta carnuda!"

Ah pois é...

23.2.07

Livros: A Morte Melancólica do Rapaz-Ostra & Outras Estórias

Nas dunas, pediu-lhe casamento,
à beira-mar se casaram.
Na ilha de Capri celebraram
esse tão grande momento.

À ceia jantaram um prato sobejo;
uma bela caldeirada de peixe e marisco.
E, enquanto ele saboreava o petisco,
no seu coração ela pediu um desejo.

O seu desejo tornou-se realidade: teve um bebé.
Mas seria um ser humano?
Pois é,
na verdade,
tinha dez dedos nos pés e nas mãos,
tinha visão e circulação.
Podia ouvir, podia sentir,
mas seria normal?
Isso não.

Este nascimento aberrante, este cancro, esta praga
foi o princípio e o fim de toda uma saga.

Ela zangou-se com o doutor:
"Esta criança, não é minha.
Cheira a maresia, a salmoura e a tainha."

"Olhe que tem sorte, ainda a semana passada
tratei de uma miúda com crista e rabo de pescada.
Se o seu filho é meio ostra
não me venha acusar...
...já pensou por acaso
numa casinha à beira-mar?"

Sem saber que lhe chamar,
chamaram-lhe Alves,
ou, às vezes,
"aquela coisa da espécie dos bivalves."

Toda a gente se perguntava, mas ninugém sabia
quando é que da concha o Rapaz Ostra saía.

Quando os quatro gémeos Lopes um dia o foram ver,
chamaram-lhe amêijoa e desataram a correr.

Num dia azarado,
Alves ficou encharcado
à esquina da rua Miramar.
Cabisbaixo,
viu a chuva rodopiar
pela sarjeta abaixo.
Na auto-estrada, a sua mãe,

à beira de um esgotamento,
esmurrava o painel dos instrumentos -
não conseguia conter
a dor crescente,
a frustração
que a fazia sofrer.

"Olha, querido", disse ela,
"isto não é para ter piada,
mas eu já não pesco nada
e acho que é do nosso filho.
Não gosto de o dizer, pois sou a mulher que te ama,
mas tu culpas o nosso filho pelos teus problemas na cama."

Ele bem se aplicou, com muito denodo;
tentou salvas e unguentos
que lhe faziam comichões,
tintura de iodo,
mezinhas e poções.
Coçou-se e sangrou e esmifrou-se todo.

Até que o médico diagnosticou:
"Eu não sei de ciência,
mas a cura do seu problema pode ser o que o causou.
Dizem que comer ostras aumenta a potência:
talvez se comer a criança
fique cheio de pujança."

Ele foi pela calada,
estava escuro como breu.
Tinha a testa suada
e nos lábios - uma mentira ensaiada:
"Filho, és feliz? Não me quero intrometer,
mas nunca sonhas com o Céu?
Nunca quiseste morrer?"

Alves pestanejou duas vezes
mas não ripostou.
O pai tacteou o punhal
e a sua gravata aliviou.

Pegando no filho ao colo,
Alves pingou-lhe a lapela.
Levando a concha aos lábios,
despejou-o pela goela.

Depressa o enterraram na areia junto ao mar
- uma prece rezaram, uma lágrima derramaram -
e para casa voltaram à hora do jantar.

A camp do Rapaz Ostra foi marcada com uma cruz.
Palavras escritas na areia
prometiam a salvação de Jesus.

Mas a sua memória perdeu-se numa onda de maré-cheia,

De volta à paz do lar,
ele beijou-a a arfar:
"Que tal uma rapidinha?"

"Mas desta vez", sussurrou ela, "quero uma rapariguinha."




A Morte Melancólica do Rapaz Ostra & Outras Estórias, escrito e ilustrado por Tim Burton, esse Edgar Allan Poe dos tempos modernos, pela primeira vez numa edição portuguesa de fácil acesso. Uma recolha de contos tradicionais saídos da mente de Burton, em brilhante tradução. Inclui, além da história do rapaz ostra, as lindas fábulas do rapaz nódoa, do rapaz torresmo, de Crispim, o hediondo rapaz pinguim, do rapaz com pregos nos olhos e da rapariga com olhos fora de série, entre muitas outras, num total de 23. É de guardar junto à mesinha de cabeceira para soninhos descansados, antes que seja tarde. Encontra-se (por enquanto) em qualquer livraria.

12.2.07

Livros: Producções Fictícias - 13 Anos de Insucessos

Tiros Certeiros:

- Entrevistas Históricas, Boião de Cultura e Herman Zap, para o Parabéns (RTP1, 1992 a 1995);

- Contra Informação (RTP 1, 1996 a esta data);

- Herman Enciclopédia (RTP 1, 1996 e 1997);

- HermanDifusão Portuguesa (Antena 1 e Antena 3, 1998, ainda as tenho em cassete BASF gravadas à pressa antes de ir para a escola);

- Major Alvega (RTP 1, 1998);

- Conversa da Treta (Antena 1, 1998 e SIC, 1999);

- Paraíso Filmes (RTP 1, 2001, queremos a série completa em DVD );

- O Programa da Maria (SIC, 2002);

- Gato Fedorento (Em Blog, livro, 4 edições em DVD e roupa interior masculina perfumada, SIC Radical e RTP 1, 2003 a esta data);

- Inimigo Público (Suplemento do Público, 2003 a esta data).

Todos estes produtos foram gerados na casa que continua a marcar o ritmo do humor no audiovisual Português: As Produções Fictícias.




O livro Produções Fictícias - 13 Anos de Insucessos procura traçar o percurso desta produtora, desde a sua pré-história na sala número 27 da Travessa da Fábrica dos Pentes até aos projectos para 2006 (altura em que o livro foi editado). Num misto de historial com antologia e album de família, neste livro temos acesso livre às almas criadoras que ajudaram a provocar as mais sonoras e memoráveis gargalhadas na última década e meia, os seus amores e desamores (relatos de violência física pelo meio) entre eles próprios, as private jokes e as alarvidades que caíram na boca do povo, os processos de escrita o meio do caos, ilustrando que Roma e Pavia não se fizeram num dia, com quase tantos tiros certeiros como tiros ao lado, sem ignorar os dolorosos e necessários tiros no pé.

Pistas para desvendar o grande mistério sobre o verdadeiro autor d'O Meu Pipi, a inclusão da versão original não-censurada da infame "A Última Ceia" (será que ninguém mete isso no Youtube?), os flyers e notas de imprensa da Paraíso Filmes, a génese do Gato Fedorento e dos Cebola Mol, relatada com um tom quase nostálgico mas longe da lamechice, e uma grande imensidão de humor de primeira apanha, tudo condensado num potente e volumoso canhenho que se lê em duas viagens de autocarro Faro-Lisboa, Lisboa-Faro.

Destaque para o seguinte trecho, sobre um certo senhor que neste momento está a ser (injustamente, a meu ver) crucificado na sua própria casa por muita gente com ideias pré-concebidas sobre um certo programa com muito potencial para crescer (aposto que para o mês que vem anda meio Portugal a papaguear "Beijinho booom"... Lembram-se da tareia que o Herman Enciclopédia levou aquando a sua estreia? Pois, eu também já me tinha esquecido), trecho esse que, embora possa parecer apatetado tirado assim do contexto, revela que este senhor é um ser humano e não um macaquinho que existe para entreter :

"Enquanto Pina, o do humor corrosivo e espontâneo, lançava as mãos à cabeça, perguntando «Mas como é que este gajo [vulgo: Miguel Viterbo, o do humor imperceptível] até sabe de pintura de barcos?!», Markl, o novato assustado, fugia com frequência para perto de um microondas, pondo o prato rotativo a funcionar com um bule de chá dentro por lhe proporcionar uma sensação de calma capaz de superar os berros de Nuno e Viterbo, disputando decibéis em discussões sobre sintaxe e semântica ou sobre férias no campo ou na praia.

Parece que, certa noite, desesperado por um raio de sol, Nuno Artur desabafou: «Quem me dera ir para a praia! Estou farto!» Segundos depois já Viterbo, cuja mundividência se caracteriza por ser diferente da do mais comum dos mortais, se lançara furiosamente no combate desta declaração: «Isso de ir para a praia é uma ideia absolutamente deprimente! Férias na praia! Que deprimente!» E continuaram por aí fora: «Mas deprimente porquê?», perguntava Nuno; «É um conceito estúpido, esse do calor e da praia», ripostava Miguel; «Mas porquê?», insistia Nuno. Markl evadiu-se para o seu improvisado estúdio zen no momento em que o tema em apreço resvalou para «o lazer nas sociedades contemporâneas». Em frente ao microondas, já nem queria saber dos cinco textos que tinham que entregar a Herman José às dez horas dessa mesma manhã..."

21.12.06

Livros: A Year in the Merde

Os Franceses são chauvinistas. Os Franceses comem baguetes. Os Franceses possuem um sotaque efeminado. Os Franceses dizem "Oh-La-La". Tudo verdade. No entanto, depois de ler A Year in the Merde, passei a considerar os Franceses criaturas adoráveis.



A Year in the Merde narra a história de Paul West, cidadão britânico solteiro e bem-apessoado, que se desloca à capital francesa contratado para planear a abertura de uma cadeia de salões de chá no país da Torre Eiffel. Ao longo de um ano, Paul West descobre uma nação onde a liberdade sexual impera, onde as greves se acumulam de semana para semana, onde toda a gente diz bom dia e boa tarde e se cumprimenta com dois beijinhos (ai que medo, os germes), onde existem feriados e pontes e o país pára nos meses de Verão, onde as prostitutas de rua declamam poesia popular e onde nem toda a gente fala inglês (que horror!). Tudo é escrito num tom bem-humorado, com recurso ao estereótipo e a uma sucessão de azares e mal-entendidos.

A Year in the Merde é uma leitura leve e bem-conseguida. O grande problema (ou ponto de interesse) deste livro é a sua tendenciosidade. Paul West (ou melhor, Stephen Clarke, o autor de A Year in the Merde) é um inglês com ares e manias de cavalheiro superior, ridicularizando para isso os Franceses por terem uma cultura diferente da sua. O simples facto das tomadas de electricidade serem diferentes é motivo de chacota. Os Franceses que tentarem falar Inglês sem dominarem a língua são rebaixados, quando a própria personagem não consegue articular duas palavras seguidas de Francês. Dei por mim a fazer o impensável: Defender os Franceses e torcer para que este indivíduo sufoque com um croissant mal mastigado.

A Year in the Merde mostra ao leitor que os Ingleses não só não entendem os Franceses (e os países latinos de um modo geral), como também estão demasiado maravilhados com o seu próprio umbigo para repararem no adubo que os cãezinhos largam nos passeios dos nossos países e assim partirem as suas perninhas e bracinhos. Das centenas de pessoas que são hospitalizadas todos os anos na França por escorregarem em bosta de cão, mais de 80% são turistas, e uma larga parte desses mesmos turistas são provenientes de países Anglo-Saxónicos. Depois deste livro, não tenho pena nenhuma deles.

4.11.06

Livros: Sr Bentley o Enraba-Passarinhos

Senhor Bentley, o Passarinheiro, o Passarão, O Enraba-Passarinhos. O Lambe-Lambe, o paneleiro corno-de-merda, peneirento, o caga-lume, o apaga-lume, o arrebita-a-nabiça, ai arrebita-arrebita!; Senhor Bentley, o Visitador de Cemitérios. Ó.



Tenho por hábito visitar várias livrarias semanalmente especialmente para saber as novidades em termos de livros técnicos. Passo sempre um bom bocado a folhear livros de ornitologia (a minha actual profissão centra-se essencialmente na observação e identificação de aves), espremendo-os até perderem completamente o interesse. Depois, agarro num romance e levo-o para casa, deixando os livros de passarinhos para outra altura.

Numa visita recente a uma dessas livrarias, encontro, entalado entre títulos como "Onde Observar Aves no Sul de Portugal" e "Collins Bird Guide", algo que me chamou a atenção. Um pequeno livro rosa-choque, perdido naquela secção mas completamente desavergonhado, de seu nome Sr. Bentley O Enraba Passarinhos, escrito por uma tal Ágata Ramos Simões. Compro-o só pela subversidade e coragem do título. E ainda bem que o fiz.

Descubro que Ágata Ramos Simões é uma jovem operadora de Call-Center que alterna a sua profissão com a paixão da escrita, sendo Sr. Bentley o Enraba Passarinhos já o seu terceiro livro. Escrito algures entre 2003 e 2004, e tendo sido recusado por 17 (dezassete!) editoras até conseguir chegar à tipografia graças à Saída de Emergência já em Janeiro de 2006, Sr. Bentley é um belo livro sobre um homenzinho sádico, crápula e mau de indumentária vitoriana que se diverte a enganar, manipular e ridicularizar todos os que o rodeiam. Completamente non-sense e agressivo, fruto de uma relação improvável entre Boris Vian e Happy Noodle Boy, mas com um toque muito seu, Virgílio Bentley é simplesmente hilariante! As visitas a campas desconhecidas no cemitério, os chazinhos com a enfadonha Miss Joyce, as conversas com o próprio diabo, as idas às casas de putas, as conversões aos tele-evangelistas, tudo é escrito com um refinado sentido de humor, que nos aperta o estômago e nos faz verter uma ou outra lágrima de tanto rir! Verdadeira pedrada no charco!


Sigam o trabalho de Ágata Ramos Simões no seu blog, escrita.blogspot.com.

Leiam a entrevista à autora, cortesia Bad Books don't E-Zine.

E passem os olhos pelo primeiro capítulo de Sr. Bentley O Enraba Passarinhos, aqui.

16.10.06

Livros: Film Posters - Exploitation

O livro que vos apresento hoje dificilmente entra para a categoria de literatura, uma vez que apresenta mais imagens que texto. Ainda assim, não posso deixar de incluí-lo no meu espaço. Encontra-se à venda na Fnac uma belíssima colecção de livros dedicados à fina arte dos posters de cinema. Divididos por décadas, que vão desde os anos 30 aos 70, existem também uns poucos mais específicos, retratando géneros cinematográficos como a ficção científica e o terror. Apesar do preço convidativo (9 euros e 90, uma pechincha), decidi-me por apenas um volume, dedicado à Exploitation.



Film Posters Exploitation é, como o próprio nome indica, uma colecção de posters relacionados com filmes, muitos deles felizmente já esquecidos, que utilizam temas chocantes e alarmistas como carburador, originalmente indo contra os valores morais e tabus da época em que eram criados, até se tornarem num género cinematográfico com mérito próprio nos anos 70. Sexo, delinquência, drogas várias, pedofilia, transformismo e minorias étnicas, eis alguns dos temas mais explorados por tantos realizadores ao longo da história do cinema, prontamente esquecidos na sua grande maioria, tal a falta de qualidade das suas obras. Porém, muitos dos cartazes destes filmes apresentam uma qualidade e uma originalidade largamente superiores aos filmes em si.



O Exploitation, como género, destaca-se dos demais pela quantidade de temas que cada categoria pode albergar. A título de exemplo, dentro da categoria "Sexo" encontramos a tara por seios grandes de Russ Meyer (o tal de Faster, Pussycat, Kill Kill, de 1966), o latex em Slaves in Bondage, de 1937, a esterelização em Tomorrow's Children, de 1934, o clássico transformista de Ed Wood Glen or Glenda, de 1953, as doenças venéreas em Damaged Goods, de 1937, e por aí fora...

Film Posters Exploitation traça a história de todo um género, combatido e censurado desde a sua génese até aos dias de hoje, enquadrando as películas no contexto social em que foram originalmente lançadas, efectivamente e sem moralizar. Alternando entre o belo e o ridículo, pleno em detalhes e pormenores interessantes, (Marijuana, de 1952, protagonizado por... John Wayne?) esta é uma compra enriquecedora para aficionados e curiosos.

18.9.06

Livros: Quando é que Jesus traz as Costoletas?

George Carlin é um dos mais irreverentes, chocantes e agressivos comediantes de stand-up do momento. Na sua natureza céptica e mal-humorada reside o seu talento, que o distingue dos seus pares, tendo sido eleito pela Comedy Central como o segundo maior comediante de stand-up de todos os tempos. Com uma carreira iniciada nos idos anos 60, este senhor conta no seu curriculum variadas edições discográficas, uma pouco respeitável filmografia e ainda a edição de alguns polémicos livros humorísticos. Quando É Que Jesus Traz As Costeletas? é o seu trabalho mais recente.

MARIA: Zé, vamos ter um bebé.

: O quê? Não pode ser. Eu só to esfrego entre as coxas.

MARIA: Pois... não sei. Deve ter havido um imprevisto qualquer.

: Quem disse que estás grávida?

MARIA: Um anjo que me apareceu no quintal.

: Um anjo?

MARIA: Um anjo do Senhor: Chamava-se Gabriel. Tinha uma trombeta e apareceu-me no quintal.

: O quê?

MARIA: Apareceu-me.

: Estava nú?

MARIA: Não. Acho que tinha uma gabardina. Não sei bem. Brilhava muito e não dava para ver bem.

: Maria, tu não andas bem. Porque não tiras uns dias de folga? As contas da loja podem esperar.

MARIA: Estou-te a dizer, Zé. O Anjo Gabriel disse-me que o Senhor quer que eu tenha o filho Dele.

: Pediste para te mandarem um sinal qualquer?

MARIA: Claro que sim. E ele disse-me que amanhã ia começar a ficar enjoada.

: Mas porque é que Deus quer um puto?

MARIA: Bom... o Gabriel disse que, de acordo com o Lucas, tem a ver com o ego. Além disso, parece que prometeu aos judeus mas esteve sempre muito ocupado até agora. Mas agora que finalmente se sente preparado para ter filhos, não quer limitar-se a fazer um de barro ou pó. Quer que haja humanos envolvidos no processo.

: E está a pensar ajudar nas despesas? Deus sabe que não podemos sozinhos. Dava-me jeito uma loja maior e podia arranjar-me uns daqueles contratos para fazer cruzes. Os romanos andam a pregar toda a gente a que deitam as mãos.

MARIA: Querido, o Gabriel disse que não há motivo para preocupações. O miúdo tem a vida feita. Vai ser um excelente orador e ter jeito para milagres.

: Ao menos isso. Olha lá, agora que estás oficialmente grávida, achas que podemos... passar à acção a sério?

MARIA: Desculpa, querido. Deus quer que isto seja um parto de uma mãe virgem.

: Não estou a perceber.

MARIA: É mesmo isso que ouviste, Zé.

: Quer dizer que não posso fazer nada?

MARIA: Ele quer que arranjes um nome para o miúdo.

: Cristo!

MARIA: Boa, Zé. És o maior!



Desaconselhado para quem se possa ofender com humor religioso, Quando É Que Jesus Traz As Costeletas? compila excertos de actuações de George Carlin, bem como novo material. Apesar do titulo, nem só de religião vive este livro. Encontramos por aqui, entre muitos outros variadíssimos assuntos, humor sobre Michael Jackson, alusões ao terrorismo, glorificação da mesquinhez do ser humano, dicas para assassinos em série, piadas sobre certas realidades Americanas que felizmente nos passam ao lado e muita prosa sobre o ódio de Carlin para com a moda dos eufemismos politicamente correctos.

No passado era assim: «O velho morreu... Por isso, o cangalheiro veio buscar o cadáver, levou-o para a capela mortuária e meteu-o num caixão. As pessoas mandaram flores e fizeram um velório. Depois do funeral, puseram o caixão num carro funerário e levaram-no para o cemitério onde acabaram por enterrar o morto numa cova.»

Hoje, nestes dias de sensibilidade acrescida, a mesma série de eventos transformou-se em algo que soa a uma experiência completamente diferente: «O idoso faleceu. Por isso, o agente funerário veio ocupar-se dos restos mortais do falecido, transportou-os para a agência funerária e introduziu-os numa urna. Os enlutados enviaram lembranças florais para serem exibidos numa sala, onde o corpo ficará em câmara ardente. A seguir ao elogio fúnebre, o veículo funerário transporta o falecido para o cemitério onde os seus restos mortais são depositados na morada final.»

Hã? O que foi? Alguém morreu ou quê?


De mau gosto e perverso, Quando É Que Jesus Traz As Costeletas? é um grande livro. Uma peça essencial em qualquer colecção, um título blasfemo que decorará qualquer estante com brilho próprio. Garantam o vosso lugar no Inferno ao lado de George Carlin, procurem-no já!

19.8.06

Livros: Caralhamas

Hoje há Cara lh amas, de E.M. de Melo e Castro.

amam-no todos
uns porque o têm
bem colocado e ereto
outros porque a foda
sem ele não bate certo

e se o nariz não chega
e os dedos se dispersam
só ele é que é capaz
de entrar todo na toda
discreto e bom rapaz

e os tristes que o não têm
amam-no doutra maneira
distantes e macios
não sabem se se vêm
ou se é só caganeira




Ernesto Manuel de Melo e Castro é um engenheiro têxtil na reforma, escritor de livros técnicos sobre o assunto e poeta experimental. Pioneiro na arte da videopoesia, foi professor universitário em São Paulo até 2001, onde leccionou Infopoesia e Ciberpoéticas da Transformação, bem como Estudos Comparados de Literatura e Língua Portuguesa. Doutourado em Literatura Africana, E. M. de Melo e Castro é autor de uma vasta obra poética, como Poética dos Meios e Arte High Tech, Trans(a)parências, Finitos mais Finitos, Signos Corrosivos e, claro está, o seu livro maldito, Cara Lh Amas: Poemas Eróticos e Sarcásticos, de 1975.

de semântica sêmea
se insinua o sémen
na lacona lagoa lacunar
e da sádica sede se ressente
o sentido
no sentido cunar.

se sádica ou sábia
quem o saberá?
Se salubre salgado
o teu sabor a odre
é a onda do útero
é terra que remorde
a espera do esperma
nas ásperas paredes.

e o significado vem
da fricção rítmica e formal
entre as mucosas rubras
do pénis, da vulva, da boca
ou da anal.

E.M. de Melo e Castro nasceu na covilhã, em 1932.

Cara Lh Amas, cortesia de monsieur Papo-Seco (link removido por ataque de spam)

5.7.06

Livros: The Pythons Autobiography by the Pythons

E agora para algo completamente diferente, um livro dos Monty Python.

The Pythons Autobiography By The Pythons é uma obra essencial para a compreensão daquilo que foram os Monty Python, fenómeno com mais de 40 anos que ainda hoje atrai novos públicos.

Um livro grande e pesado com centenas de fotografias e dados estatísticos, esta biografia oficial consiste na compilação e contextualização de entrevistas dadas por todos os membros da trupe (incluindo o há muito falecido Graham Chapman), sobre assuntos que vão desde os seus anos de infância, até ao seu desmembramento e mais além, passando obviamente pelo Flying Circus, pelos filmes e discos, pelos especiais em alemão. A qualidade das fotografias é inegável, com bastantes raridades para apreciadores dos Python e um detalhe tal que assegura a longevidade de um livro já de si enorme, e esta visita aos bastidores dos génios da comédia non-sense demonstra bem a originalidade e autenticidade do grupo, anos-luz à frente do seu tempo.

Os Python reunidos (Chapman está dentro da urna dourada)


O livro está estruturado como se fosse uma das animações de Terry Gilliam, e todos os membros lançam farpas uns aos outros como se ainda estivessem juntos. É esse o sentimento que o livro passa. Apesar de se terem separado oficialmente em 1982, os Monty Python vivem! Fãs dos Python, não se acanhem com o preço deste livro se o virem à venda...



Comprei o meu na Ghoul Gear, em Faro. Provavelmente a Fnac também o terá. Apenas disponível em Inglês, e não inclui absolutamente nada sobre o musical Spamalot.

12.6.06

Livros: O Velho e o Mar

Eu não gosto de Ernest Hemingway. Não gosto da atitude ultra-machista que teve durante quase toda a sua vida, arrepia-me o seu fascínio por armas de fogo, o seu amor por touradas, a sua participação voluntária em ambas as guerras mundiais e na guerra civil Espanhola, o seu alcoolismo violento. Já li bastantes livros de Hemingway, e não gosto de nenhum. Nenhum! Excepto dO Velho e o Mar.




Escrita em Cuba no ano de 1951, O Velho e o Mar é a última grande obra de Hemingway a ser publicada em vida. Inspirado pelas histórias e modos de vida dos pescadores locais, Hemingway narra a batalha de um velho lobo do mar em maré de azar contra um peixe de grandes dimensões, a sua maior pesca numa longa vida piscatória. Dois dias de luta intensa para dominar o espadarte, e mais alguns dias remando de volta para terra, enquanto delira de fome e cansaço e defende a sua presa dos ataques de tubarões.

O Velho e o Mar é um pequeno épico, há dimensão do seu próprio protagonista. Os diálogos interiores durante grande parte da obra e o respeito pelo espadarte, apelidando-o de "irmão", encontram paralelo nas vidas das populações piscatórias do Portugal de antigamente. Aqui encontra-se a materialização das histórias que ouvia em pequeno quando ia buscar o meu avô à taberna. Vencedor do Pulitzer Prize de 1953 e fulcral para a obtenção do Nobel da Literatura em 1954, encontramos no velho pescador um Hemingway já cansado e à procura de redenção. E eu fui educado a respeitar os pescadores, por muito arrogantes e aldrabões que sejam. Hemingway enganou-me desta vez! Odeio-o por isso também!

10.5.06

Livros: Do Grande e do Pequeno Amor

Do Grande e Do Pequeno Amor é um romance cruzado com fotonovela. Do Grande e Do Pequeno Amor é uma história narrada por fotografias, com texto ilustrativo. Do Grande e Do Pequeno Amor é um livro complementado com imagens. Do Grande e Do Pequeno Amor é uma agradável surpresa.



Do Grande e Do Pequeno Amor é um esforço conjunto do fotógrafo e ilustrador Jorge Colombo e da escritora Inês Pedrosa. Neste romance/album de fotografias, é-nos contada a estória de Alexis e Ken, dois Nova-Iorquinos que não se suportam mas que não conseguem viver um sem o outro. Os tempos modernos e o stress do dia a dia junta-os, separa-os, junta-os, separa-os, junta-os... E separa-os novamente, para se voltarem a encontrar. Um ciclo vicioso comum a muitos. O amor bruto em estado líquido.

O livro em si lê-se num sopro, mas a intensidade das fotografias perdura. Um excelente trabalho fotográfico de Colombo, conferindo intensidade e candura ao texto de Pedrosa. Brilhante e muito aconselhável, especialmente para pessoas que vivam ou tenham vivido a situação descrita.

Uma preview deste livro em Quicktime (?) disponível aqui.

4.4.06

Livros: Porno

No seguimento do post sobre o Trainspotting, o Literatura de Culto deste mês debruça-se sobre algo de que toda a gente gosta mas nem todos o admitem, Porno...

Porno é o sétimo romance de Irvine Welsh, escritor Escocês obcecado por drogas duras e cultura Pop. Este romance é simultaneamente a sequela literária de Trainspotting, e a sua acção decorre 10 anos após as primeiras aventuras. Desta feita, o sexo é a droga que vem substituir a heroína como força motriz.

Porno é um livro direccionado apenas a quem leu/viu Trainspotting, pois voltamos a encontrar o mesmo grupo de indigentes que aprendemos a amar e mais alguns de outra obra de Welsh, intitulada Cola. Após a sua famosa fuga no final do primeiro livro, Mark Renton torna-se num infeliz proprietário de uma discoteca em Amesterdão. Begbie está obviamente na cadeia, recebendo todos os meses um pacote de revistas pornográficas gay sem conhecer o seu remetente. Spud (ou Batata) continua um pobre coitado agarrado ao cavalo, imaginando formas de salvar a sua mulher e filho da miséria, seja na vã tentativa de escrever um livro sobre a sua terra natal, seja por tentar que o assassinem de modo a que a sua família receba uma compensação pela perda.

Sick Boy, esse, toma o papel central no palco deste livro. Proprietário de um Pub Escocês, sonha com grandezas que tardam a chegar e deseja vingar-se de Renton com todas as suas forças. Um dia, um dos amigos do seu grupo de coquinados aparece no Bar com ideias de filmar um filme pornográfico na arrecadação do mesmo. A estrelinha da sorte brilha com mais vigor sobre Sick Boy! Entretanto Begbie é solto, e juntamente com o seu amigo pornógrafo, descobre Renton na Holanda. Mark borra-se de medo de Begbie, e para evitar ser descoberto por ele aceita financiar o filme pornográfico de Sick Boy. O plano de vingança é posto em prática.

Apesar de divertido e muito mais light do que a obra anterior, Porno acaba por revelar-se mais do mesmo. Algumas situações são apenas reciclagens doutras vividas 10 anos antes, e as personagens não mudaram um bocadinho. Sick Boy continua maquiavélico, Begbie não amoleceu um grama, Renton mantém-se falso e Spud é a personificação perfeita do agarrado. Ainda assim, é óptimo voltar a encontrar estas personagens e saber o que têm feito desde que largaram a heroína (quase todos, pronto).

Porno será adaptado ao cinema um dia, quando os actores de Trainspotting tiverem envelhecido o suficiente. Enquanto isso não acontece, o livro anda por aí e não é nada difícil dar com ele.