13.8.10

SW 2010: Vens ver ou vens levar cum pau pas costas?

Este ano prometi a mim mesmo curtir um Festival de Verão à antiga. Já tinha ido 2 dias ao Optimus Alive, mas queria ir a um clássico, daqueles com campismo reles, concertos a rodos e boa onda generalizada. A escolha, por condicionantes profissionais, recaiu sobre o Sudoeste TMN 2010. Certo que, dos festivais grandes, era o que apresentava o cartaz mais fraquito, mas um ardente desejo de ver Flaming Lips no dia 5 por minha parte, muita vontade de ver Jamiroquai no dia 6 por parte dos meus companheiros de jornada e extrema necessidade de ver Beirut por parte de umas pessoas de quem gosto e com os quais já não estava há imenso tempo, e assim sendo, a Música no Coração ficou com os meus 80 € e eu fiquei com acesso aos dias todos do Festival, incluindo o infame dia de merda que afinal nem foi assim tão merdoso. Aqui fica um registo detalhado e palavroso do que vi e vivi por lá.

4 de Agosto - Recepção ao Campista

No dia da pré-época, saí de minha localidade juntamente com os meus dois comparsas já o Sol se punha, depois de uma jornada de trabalho. Longas horas por estradas mal iluminadas e sinuosas, e um condutor tresloucado rindo às gargalhadas enquanto fazia 3 quilómetros de curva apertada para a direita seguidos de 5 metros de curva para a esquerda e 10 metros de curva para a direita, até atravessar as duas casas e o poste de electricidade que constituem a localidade "Peúgas a Secar na Corda" (esta não existe mas pouco falta) e apanhar mais curvas imbecis. Um turbilhão de emoções fortes até finalmente se chegar ao SW, já a noite corria bem avançada. Aí, foi atirar a tenda para o primeiro buraquinho disponível e siga para o recinto que já lá estão os DJs.

Com o avançado da hora, só chegámos a tempo da actuação do Zé Pedro dos Xutos, mas uma viagem tão extenuante como a que havíamos tido requer uma rápida manobra de re-hidratação, pelo que na altura em que correm abruptamente com o Zé Pedro dos Xutos do palco já estávamos bem mais pobres, mas também mais alegres e dançarinos. Mesmo no ponto de rebuçado para os 2 Many Dj's. Os meninos Soulwax entraram em palco sintonizando um transístor em rádios locais, mas rapidamente passaram para a electrónica pura e dura, o que, apesar de bem conseguida, me fez passar vergonha entre os meus pares, depois de ter passado a duração de 2 cervejas a explicar-lhes o conceito de Mash-up. Os homens praticamente inventaram o género e agora já não o passam? Passam, passam, só que não se limitam a isso e ainda bem. Algumas misturas e remisturas muito bem conseguidas, com o ponto alto a chegar com "Roots Bloody Roots" dos Sepultura e testar a potência do sistema de som do Festival. Foi feliz.

Depois da actuação do Belgas não me lembro se houve mais alguma coisa, mas com o cansaço e a cerveja eu já só queria xixi-cama e foi assim que terminou o primeiro dia de Festival.

Uma foto do primeiro dia de SW:

Uma das muitas terras "miseráveis" por onde passámos


5 de Agosto - Flaming Lips e pouco mais

O SW10 é uma área ampla com uma zona de restauração decente, insuficientes casas de banho mas muito mato para ser regado, diversões que vão dos matraquilhos à montanha-russa, e 3 palcos, o principal onde actuam os cabeças de cartaz, o secundário onde actuam as bandas menos conhecidas mas quase sempre mais interessantes, transformando-se posteriormente em tenda de DJs, e o palco Reggae onde está sempre a dar a mesma música. É um festival conhecido por se situar numa área com imenso pó, e popularizou-se por trazer habitualmente cartazes bastante fortes e consistentes, mas de há uns anos para cá a qualidade dos mesmos tem vindo a decair e o público, que nunca foi especialmente bom, actualmente está reduzido a putos que acham que devem de ir a um Festival porque fica bem no curriculum e se não fossem os Espanhóis que na sua essência são os verdadeiros festivaleiros em espírito e boa onda isto era uma desgraça. Em termos de condições para se viver, o Festival possui uns chuveiros decentes e um canal de rega bastante aprazível para uns mergulhos, com a presença constante de um DJ. Antigamente perto do canal funcionava uma área de Workshops mas hoje em dia já toda a gente nasce ensinada.

O campismo do Sudoeste é uma merda. Eu já o conhecia e já o sabia, apenas não me recordava. Aliás, o campismo em qualquer festival é uma merda, mas o do SW tem a particularidade de ser simultaneamente o com menos sombra e temperaturas mais elevadas. Este ano ainda estreou a modalidade Car Camping, uma maneira de roubar mais uns euros aos tristes que caíram na esparrela, estacionando o carro ao Sol e montando a tenda ao lado da viatura, o mesmo que o visitante casual costuma fazer sem ter de pagar mais por isso. Quanto a nós, além de termos sido umas bestas por colocarmos a tenda em cima de pedras e paus, ainda fomos brindados a noite toda com um concerto de Djambés e batucada geral. Juntando a isso o facto de alguém ter tentado a sua sorte ao tentar desmontar-nos a tenda porque não nos queria ali perto do "seu" espaço e de ter sido mandado violentamente cordialmente para o caralho e pode-se dizer que não foi uma noite muito bem dormida.

Nada que um dia inteiro de papo para o ar na praia da Zambujeira do Mar não remedie, especialmente quando o areal está minado de miúdas giras, dizem os meus companheiros que eu nem reparei pois tenho uma namorada muito mais bonita e interessante e que lê o meu blog!!!

A noite foi iniciada no palco Reggae, onde depois de uns minutos sempre a ouvir a mesma música encontrei uns amigos e fomos todos contentes da vida para o palco principal, onde os Bomba Estéreo iniciavam a sua actuação. A banda colombiana possui uma vocalista que é um autêntico metro e meio de garra, tal foi a entrega com que brindou as escassas pessoas que se juntavam frente ao palco. Misturando a tradicional Cumbia Colombiana com Electrónica, a banda conseguiu fazer com que os corpos bandoleassem o suficiente para que a sua actuação tivesse saldo positivo. Colocássem-nos no FMM de Sines ou no MED de Loulé, com público sintonizado na World Music, e a sua actuação teria sido lendária.

Findada a actuação dos Bomba Estéreo, veio a melhor banda ao vivo que já tive oportunidade de presenciar: The Flaming Lips, E, 5 minutos depois do inicio, com a senhora do ecrã gigante a parir a banda, o vocalista Wayne Coyne a passear por cima da minha cabeça dentro de uma bola gigante e um arsenal de confettis e balões a serem arremessados continuamente para o público, já berrava e pulava em estado de delírio histérico, "ESTE É O MELHOR CONCERTO DA MINHA VIDA!", frase hiperbolizada pela emoção do momento mas com muita verdade nela contida, pois se não foi o melhor foi certamente aquele no qual mais berrei, pulei (descalço, pois os chinelos saltaram-me dos pés), cantei e delirei, e tudo isto sem recurso a estupefacientes! A projecção de imagens ao longo das músicas foi perfeita, a constante chuva de papelinhos multi-cores, as mãos gigantes, os lazers, os adolescentes palpitantes alaranjados, o urso em palco, as fortíssimas canções de Embryonic com destaque para a excelente "Worm Mountain" a abrir e a divertida "I Can Be a Frog" lá mais para o fim, a recordação do seu primeiro grande hit "She Don't Use Jelly" e o brilhante final com "Do You Realize??" a fechar com chave de ouro uma hora e quarenta e tal minutos de alegria pura. Consta nas publicações especializadas que o público se mostrou apático durante o concerto (retardados!) mas estava tão bem lá à frente a viver o momento que nem perdi tempo a olhar para trás, fosse eu correr o risco de perder o que quer que fosse daquele palco. Como uma criança de 6 anos que descobre que existem gelados de morango e que quer que aquele sabor dure para sempre, assim fiquei eu com o concerto dos Flaming Lips, se pudesse via-os todos os dias da minha vida que o sabor nunca se perderia!

Resumindo, gostei.

Mas a seguir veio M.I.A. e desse já não gostei. Os graves estavam tão exageradamente altos que tudo vibrava no recinto: vibravam os meus cabelos, dentes, roupa, neurónios enquanto estive na fila da frente, vibravam as tendas da comida, vibravam os palcos secundários, vibravam as tendas do campismo. Foi como se o homem do saco me tivesse roubado o gelado oferecido pelos Flaming Lips, me esbofeteasse e me urinasse para cima. Com tanto grave, as músicas que de si já não variam muito pareciam todas iguais, e como o palco estava muito escuro em contraste com o delírio visual anterior, não consegui apreciar em condições o concerto da MC.

No final, já com as pernas em papa (os chinelos eram muito maus) ainda me arrastei para o palco secundário para ver um pedaçito de Kruder & Dorfmeister, mas as condições escasseavam e fui para a caminha que já tinha dado o Vitinho.

Uma foto do segundo dia do SW:

Wayne Coyne segundos antes de me atropelar


6 de Agosto - Vamos ajudar o J.K. a comprar coca

Segunda noite horrível no campismo, com a electrónica do Palco Secundário a servir de banda sonora para a tortura dos paus e pedras que se iam alojando nas minhas costas, e o concerto de djambés e batucada da noite anterior a continuar no preciso momento em que conseguira adormecer. Cheios de mau feitio dirigimo-nos para a fantástica Vila Nova de Mil Fontes, uma simpática localidade que mete qualquer um bem-disposto, com uma praia que mesmo não sendo tão exageradamente bem frequentada como a da Zambujeira do Mar, chegou para que alguém se apaixonasse.

A noite festivaleira começou no Palco Secundário para se escutar o Hip-Hop de Ladi6, uma Neo-Zelandeza com uma excelente presença em palco, secundada por um DJ muito competente e interventivo. Ladi6 faz a já costumeira mistura de Soul e Hip-Hop, mas a sua simpatia e competência conseguiu quebrar o gelo inicial e no final do concerto o público já lhe comia nas palminhas das mãos. Uma agradável surpresa.

A seguir foi-se ao Palco Principal ver um pouco de James Morrison, o suficiente para nos dar vontade de ouvir música, e assim rumámos para o palco secundário mas lá música não encontrámos, pois estava em palco o Virgul dos Da Weasel com o seu projecto de banda-sonora-para-Feira-Popular Nu Soul Family. Ainda a procurámos no Palco Reggae, mas como lá estava a dar sempre a mesma música fomos jogar matrecos e beber coisas com álcool. Nota positiva para os seguranças que deixam entrar para o recinto qualquer tipo de bebida alcoólica, desde que a mesma esteja dentro de garrafas de plástico. Com imperiais a 2 €, foi boa onda!

De repente estou sozinho no Palco Secundário e inicia-se o concerto de Lykke Li. A Sueca deu um espectáculo poderosíssimo em intensidade e não desiludiu nem um bocadinho. Num concerto mais percussionado que electrónico, a temas mais conhecidos como "Dance Dance Dance" e "Little Bit" juntou dois temas novos e ainda brindou o público com uma cover da "Silent Shout", dos conterrâneos The Knife e um ensaio a "Ready Or Not" dos Fuggees. Vestida de negro tal como a banda e envergando um véu a espaços, a artista pouco falou mas o seu olhar e linguagem corporal ecoaram pelo espaço. Concerto curtinho, mas bom para cacete!

Seguiu-se Jamiroquai no palco principal. Este foi o meu terceiro concerto desta banda, e assim sendo tenho base de comparação. A primeira vez que os vi havia sido precisamente no Sudoeste, em 2003. Segundo as publicações da época, J.K. encontrara-se com o pai pela primeira vez nessa noite (o pai é Português) e estava particularmente excitado. Segundo as más línguas, J.K. tinha tido uma overdose de cocaína, esteve às portas da morte, mas recuperou a tempo do concerto. O que interessa é que foi um espectáculo do caraças, a banda estava afinada e o artista cantou, dançou, saltou e conversou com o público durante o tempo todo. Dois anos mais tarde, em Albufeira, surgiu o Festival Sunrise, basicamente mais uma desculpa para a banda regressar ao nosso país. O concerto foi novamente muito bom, a banda deu o litro e havia disco novo, Dynamite. Passados 5 anos e a banda já não é o que era. O concerto foi apenas um desfilar de êxitos uns atrás dos outros, o que teoricamente significa um espectáculo mais rico para ouvintes casuais, mas com a banda em piloto automático e J.K. envergando a maior cara de frete de todos os tempos, até parecia que lhes estávamos a fazer um favor por estar lá. Ao vocalista só faltava olhar para o relógio de vez em quando para ver se faltava muito para acabar. Interacção com o público nula, dança reduzida ao essencial, actuação pouco inspirada, vamos lá acabar isto que é para eu receber e estourar o guito em branca. Foi uma pena.

Seguidamente ainda espreitei o concerto dos Orelha Negra, o suficiente para concluir que a banda resulta melhor em disco que ao vivo. Creio que se tivessem sido colocados a horas mais decentes no Palco Secundário o concerto teria sido mais interessante. Assim, foi-se alternando entre o Palco Principal e o Palco Reggae onde estava sempre a dar a mesma música.

Uma foto do terceiro dia do SW:

Ladi6 com os olhos fechados.


7 de Agosto - O dia de merda que afinal até nem foi mau

Mais uma noite terrível de campismo, somando-se ao já habitual "Opus de Djambé para campista festivaleiro" e aos restos da tenda da brita um grupo de Espanhóis que esteve a tocar a mesma canção à guitarra durante bem mais de uma hora! Desta vez os paus e as pedras não chatearam porque fui esperto e adquiri um colchão de encher em Vila Nova de Mil Fontes. Isto é um Festival, não é a Via Sacra.

O mau humor matinal foi curado com uns mergulhos no canal de rega do campismo, com uma temperatura de água muito melhor do que qualquer praia da região e um DJ a passar música pouco abrasiva. Seguiu-se uma tarde em Odeceixe, e se mais nada se aproveitasse destas férias, as variadas e lindíssimas praias que tivemos oportunidade de visitar fariam com que toda a viagem tivesse valido a pena.

O dia 7 era considerado o dia mais fraco. Com um Palco Secundário constituído quase na totalidade de bandas portuguesas, um Palco Reggae sempre a dar a mesma música e bandas como Sugarbabes e Tim dos Xutos no Palco Principal, é natural que muita minhoca se encolhesse para dentro do prepúcio. Mas eu sou pessoa de coragem e enfrentei o dia com bravura, e, enquanto os meus dois cobardes companheiros optaram por rumar à localidade de acolhimento para verem o Benfica a perder, estacionei a garrafa de Vodka Limão no Palco Secundário e por lá fui ficando.

E ainda bem porque logo no inicio da tarde apanhei com o espectacular concerto dos Diabo Na Cruz, projecto que conta com gente dos Feromona, Jorge Cruz, B Fachada e aparentemente um clone do Manel Cruz vindo de uma máquina do tempo directamente de 1998 para tocar baixo, bigodinho incluído. Os Diabo Na Cruz fazem um bem conseguido cruzamento entre a verdadeira música tradicional Portuguesa e o Rock, conseguindo criar uma sonoridade interessante e acima de tudo empolgante. As letras são castiças e alojam-se bem no ouvido, e a banda tem uma atitude de curtição contagiante, estando visivelmente a divertir-se em palco e levando o público na sua onda. O album Virou! foi tocado quase na íntegra, e ainda tiveram tempo de nos brindar com uma muy bem conseguida versão da "Lenga-Lenga" dos Gaiteiros de Lisboa. Brilhante concerto, um das memórias a reter do Festival.

Seguiram-se os Anaquim, banda cuja denominação me irrita profundamente. E quando antipatizo com o nome de uma banda, fico sempre à espera que me compensem de alguma forma. Mas a banda lá se redimiu, tocando uma versão saltitante do genérico dos clássicos desenhos animados do Tom Sawyer. A música, acústica porém energética, soa bem ao ouvido, e as letras estão bem sacadas, especialmente as dos seus maiores sucessos, "As Vidas dos Outros" e "Na Minha Rua". O senhor vocalista lançou umas frases inspiradas sobre amores perdidos que só não atingem quem nunca os teve, e ainda conseguiu fazer um pseudo-dueto por telepatia com o espírito de Ana Bacalhau. Quase, quase, quase me convenciam!

No alinhamento seguiram-se os Britânicos Friendly Fires e no final do concerto, a tenda do Palco Secundário escorria suor, sendo que metade do mesmo pertencia ao vocalista da banda, que a páginas tantas suspirou um "não se admirem se eu desmaiar". O homem dançou que nem um perdido perante uma plateia muito bem composta e em estado de ebulição, numa das noites mais quentes do Festival. Praticantes de uma Electrónica com raízes no Pós-Punk, os Friendly Fires atiraram-se com unhas e dentes a temas como "Jump in the Pool", "White Diamonds" e "Ex-Lover", deixando-me de queixo caído, especialmente por conhecer deles apenas "In The Hospital", o tema dos separadores da Sic Radical, e pouco mais. O vocalista é um entertainer nato, cantou, dançou violentamente, pulou e só lhe faltou fazer crowd surfing para a entrega ser total. Grande estreia.

E com 3 concertos bem interessantes no bucho, o dia de merda estava a ser tudo menos isso, mas a maior surpresa da noite estava reservada para o fim. Num Palco Principal decorado com um estilo Disney/Tim Burton surge Mika. Isso mesmo, Mika. O maior Showman do Festival. E deu um concerto do caraças, cantando, dançando e comunicando constantemente com o público em Português e Inglês, num modo de tradução instantânea a cada palavra que pronunciava. Foi o concerto mais festivaleiro do certame, com o público a interagir entre si (finalmente) e o músico a deixar a pele em palco, certificando-se de que toda a gente dê o seu tempo por bem empregue. Surgiu uma perna gigante no meio do público durante "Big Girls", uma enorme bandeira em homenagem a um amigo desaparecido e um momento tocante em "We Are Golden", quando praticamente todo o público levantou uns corações dourados oferecidos pelo patrocínio. Uma agradável surpresa e um "toma lá para ver se é desta que aprendes a não julgar o livro pela capa".

Uma foto do quarto dia do SW:

O meu lado era o mais arrumadinho, do colchão. Experiência de outros Festivais: tenda desarrumada nunca é assaltada


8 de Agosto - Temos Festival!

Djambés, guitarradas e britalhada ainda se vai aguentando sofridamente, mas quando o vizinho do lado adquire um megafone e passa a noite a debitar catchprases de videos da net já a porca torce o rabo! Felizmente choveu perto da manhã, o que me proporcionou uma preciosa hora de sono que guardei com ternura para o resto do dia!

Com os meus colegas a destilar dentro da tenda, fui passear pelo recinto vazio, algo que gosto muito de fazer mas que ainda não tinha tido oportunidade. É um exercício interessante e recomendável, dá para se reavivarem memórias de Festivais passados e tomar o pulso ao espaço. Quando visualizo o Sudoeste, na minha mente os concertos são sempre ao final da tarde, o Sol já não castiga tanto e a cerveja escorrega como se fosse a primeira depois de um longo dia de trabalho. Nesta altura tive a oportunidade de ver o Soundcheck de Mike Patton e perceber logo ali que teria pela frente um concerto muito especial.

Depois de uma visita fugaz por uma praia cujo nome se perdeu, a última noite do Festival começou com peixe:avião no Palco Principal. O melhor deste concerto foi mesmo o mojito divinal que comprei na economia paralela, dentro do campismo. Os Bracarenses deram seca e partimos antes do encore.

No Palco Secundário actuava Carminho, uma menina muito linda e simpática que por acaso até tem um vozeirão capaz de deixar os estrangeiros de olhos esbugalhados e os Portugueses a exclamar AH FADISTA aquando cada nota mais emotiva. É com satisfação que se constata que o público fez as pazes com o Fado e já volta a rever-se nele, e prova disso é a oportunidade dada ao estilo musical num Festival supostamente Rock (já foi, em tempos...) não só a Carminho como a Camané e Mariza (e os Deolinda, que mesmo não o sendo tem muito de Fado na sua essência) em edições anteriores.

Palco Principal, e já com o nosso grupo reforçado com 3 entradas novas, seguiu-se o concerto de Mike Patton e do projecto Mondo Cane. Desta feita, o homem dos Mr Bungle e Fantômas juntou-se a um grupo de músicos Italianos e, nesta ocasião, à Orquestra do Algarve, para reciclar clássicos da canção Italiana dos anos 50 e 60. Algumas interpretações mais próximas do original ("Il Cielo in Una Stanza" é das belas canções alguma vez escritas), algumas mais Pattonianas, com recurso a urros, berros e o seu querido megafone (especialmente em "Urlo Negro"). As canções ganham potência não só com a voz do senhor Faith No More mas também graças ao brilhante maestro que dirigiu possivelmente os membros mais porreiros da Orquestra do Algarve (alguns também berravam para dentro dos instrumentos) e o grupo de músicos Transalpinos, dos quais destaco aquele que apelidei carinhosamente de Wolverine Velho e que me deleitou com a sua mestria no Theremin. No encore, a banda saíu de palco, mas a Orquestra manteve-se quieta pois o seu maestro "esquecera-se" de os mandar para casa. Assim sendo, um regresso a palco, um encore, uma vénia colectiva e um aplauso genuíno de quem se prontificou a vivenciar um concerto mágico . Este foi possivelmente o derradeiro espectáculo deste projecto, mas se Mike Patton não voltar ainda este ano voltará certamente para o próximo com outra das suas milhentas bandas. Se eu fosse a ele comprava cá um Time-Share.

De seguida, voámos para o Palco Secundário para tentar encontrar um buraquinho decente e ver Beirut, mas com a tenda cheia como um ovo inicialmente não tivemos sorte. Passados 15 minutos o cordão de segurança começou a afrouxar e lá conseguimos furar para um local mais confortável, com espaço até para se darem mini-passinhos de dança. A estreia em Portugal deve ter sido avassaladora para a banda de Zach Condon, tal a devoção mostrada pelo público que cantou em coro praticamente todas as letras, o ar dos pulmões insuflando a tenda especialmente em "A Sunday Smile", o seu tema de maior sucesso. Rubro em "The Penalty" e "Nantes", execução perfeita, trompetes a conquistar os mais reticentes e um encore que ficou a faltar porque o tempo no Palco Secundário é contado ao milímetro. Os fãs de música afinal estavam no Sudoeste e chegavam para encher uma tenda! Fiquei feliz.

E enquanto nos outros dias se lutava para arranjar que fazer durante vários concertos mais merdosos, neste dia, num erro crasso de organização, colocam-se duas das mais válidas bandas do Festival inteiro à mesma hora! Muito mal jogado. Mais um sprint até ao Palco Principal para tentar apanhar o máximo possível do concerto de Air. Desperdicei 2 oportunidades de os ver este ano, simplesmente porque o dinheiro não chega para tudo e tem vindo tanta coisa boa ao nosso País que algumas bandas têm de ficar para segundo plano. Só consegui apanhar a recta final do concerto, mas ainda vi "Alpha Beta Gaga", "Kelly Watch the Stars", "Sexy Boy" e mais duas. Deu para perceber que perdi um excelente concerto, mas eu não sou de ficar a chorar pelo leite derramado e curti como pude, abanando a anca e assobiando com ar gingão. Fiquei com vontade de os apanhar por aí um dia destes e ver o seu espectáculo do principio ao fim.

A seguir veio Massive Attack. E eu tenho feito ao longo dos anos esforços genuínos e sinceros para gostar desta banda, mas simplesmente não consigo. O concerto estava muito bem estruturado, com várias mensagens traduzidas para o idioma local a passar no ecrã gigante e a impelir à reflexão, mas a sonoridade não me entra bem no ouvido. Resisti como pude, mas às tantas desisti e fui ver um bocadinho da banda suporte do Bob Marley a tocar sempre a mesma música no Palco Reggae. Cinco minutos depois desisti também dessa banda de covers deles próprios e fui brincar aos matrecos e à palhaçada. Às tantas veio um Superstar DJ, David Ghetta, para transformar o recinto do Sudoeste na maior pista de carrinhos de choque de Portugal, mas eu estava muito cansadinho de 5 dias de Festival e, tentando não escorregar no azeite, fui dormir o sono dos justos para o banco de trás do carro. Acordei uma vez a meio da noite, para desfrutar do silêncio total, só cortado de vez em quando por um grilo distante.

Uma foto do quinto dia do SW:


Sentadinho bebendo um Mojito de contrabando e desfrutando de música ao vivo, perco o direito de me queixar da vida durante 6 meses

Rescaldo

Talvez o Sudoeste não tenha sido a escolha mais feliz para matar o bichinho de curtir um Festival de Verão do inicio ao fim. Musicalmente, sei que seria muito mais feliz num Super Bock Super Rock ou num Paredes de Coura. A minha decisão por este Festival em particular baseou-se na promessa que havia feito a mim mesmo, de ver Flaming Lips antes de morrer. Agora que os vi, faço a promessa de os voltar a ver a cada oportunidade que tiver.

Cinco dias parecem-me excessivos. Bem feitas as coisas, compunha-se o último dia um pouco melhor em termos de horários e dividiam-se as bandas dos outros 4 dias em 2, e ficávamos um Festival com mais suminho. Gastava-se menos dinheiro e ganhava-se em termos qualitativos. Quem gosta de música deixaria de olhar para o cartaz do Sudoeste com ar desiludido. Este já foi o melhor Festival de Portugal, mas a caminhada para o abismo ainda vai a tempo de ser invertida.

Participar num Festival em pleno deverá ser uma experiência a repetir, mas a fazê-lo será com outras condições de alojamento. O banco de trás do carro ganha a qualquer campismo de Festival, sem dúvida alguma, e hoje, mais de uma semana depois, ainda estou a recuperar os sonos atrasados.

Bem feitas as contas, gostei. Como poderia não gostar? Praia, calor, concertos, amigos, cerveja e sandes de hamburger de soja na mochila. Há lá vida melhor?

12.8.10

5 tartarugas ninja

Donatello



Raphael



Leonardo



Michaelangelo



Vanilla Ice