27.1.11

Concertos: Joanna Newsom @ CCB

(Foto roubada à Rita Carmo)


No passado dia 26, o centro Cultural de Belém foi a derradeira casa de uma fada mágica que deambulou pelo Porto e Aveiro antes de espalhar o seu pó mágico por Lisboa. Joanna Newsom, resistente daquilo que em tempos se convencionou chamar Freak-Folk, agora artista para gente erudita de bem, desde sempre um monstro de talento!

Foi a minha primeira vez no Grande Auditório do CCB. Gostei do espaço, uma construção robusta tal como o restante edifício, que há-de durar mais que Portugal e um dia servirá de recreio para os peixinhos quando os níveis do Tejo cobrirem a baixa de Lisboa num futuro que se quer longínquo. Lá dentro, muita gente que parecia ter ficado ali a dormir desde o discurso de vitória presidencial de Cavaco Silva (mas que tiveram tempo para manter a sua farpela imaculada), alguns friques semi-disfarçados, uma fatia simpática de senhoras de idade avançada que claramente não sabiam ao que vinham (o CCB tem uma tarifa sénior muito vantajosa para quem pode dela usufruir), e eu com o meu amigo das aventuras a solo, que por pouco não foi para o Centro Cultural de Belém de fato de treino. Atrás de mim, um mentecapto concerteiro (em todos os concertos há um, e está invariavelmente sentado perto de mim), que volta e meia fazia comentários "engraçados" para impressionar a sua acompanhante, recém-namorada ou prestes-a-sê-lo. O que me leva a crer que nesta vida só não se safa quem não quer.

A abrir o concerto esteve o baladeiro Escocês Alasdair Roberts, notoriamente desconhecido para a maioria do público. Sozinho, com a cortina do palco fechada atrás de si, e munido da sua guitarra acústica, Alasdair desfilou algumas das suas cantigas mais recentes, regressando ao passado apenas em 'Waxwing', um tema do seu disco mais reconhecido (pelo menos para mim), The Amber Gatherers. Simpático, fez o que pode para cativar o público, que se mostrou um pouco indiferente, excepção feita a 'The Whole House Was Singing', onde finalmente conseguiu arrancar da audiência um coro tímido, porém ternurento. Gostei do Alasdair, a sua voz traz-me à memória os hobbits do Shire, o bucolismo campestre, a ideia romântica da Escócia verde tradicional.

Meia hora de espera depois do final de Alasdair, heis-que entra Joanna Newson, correndo palco adentro. Delicada, acenando, toda ela sorrisos, agarra-se à harpa e inicia o concerto sozinha em palco, com '81'. E todo o público ganha repentinamente estrelinhas nos olhos, e muitas bocas ficam por fechar, e o concerto está ganho. Impressiona a destreza na harpa, instrumento imponente e maquiavélico de dominar. Impressiona também a voz de Joanna, menos estranha que nos tempos iniciais, igualmente forte. Esta rapariga claramente pode fazer o que quiser com as suas cordas vocais, e é ao vivo que se tem a real percepção disso. Segue-se 'Have One On Me', já com a banda de multi-instrumentistas multi-talentosos. Joanna, sempre simpática, saltita de nuvem em nuvem entre a harpa e o piano. Regressa-se ao passado com a complexa 'Cosmia', a divertida 'Inflamatory Wrist' e a épica 'Emily', mas o prato forte do concerto é o triplo Have One on Me, galardoado como melhor disco de 2010 para várias publicações da especialidade. 'Easy', 'Soft as Chalk', 'No Provenance' e 'Good Intentions Paving Company', esta última com um soberbo solo de trombone, coloriram a noite. Para o final, uma surpresa: a minha canção preferida de todas as minhas canções preferidas de Joanna Newsom, que tem ficado de fora do alinhamento dos concertos mais recentes, 'Clam, Crab, Cockle, Cowrie'. Esta foi mesmo só para mim!

O público foi extremamente respeitador durante todo o concerto, poucos se aventuraram com palminhas. Joanna não deve estar muito habituada a tanto respeito, e bem que, entre canções, foi tentando espicaçar a audiência, que reagiu por fim quando a artista se "enganou" (propositadamente, como mais tarde se viu) e soltou um "muy obrigado", levando a um coro de correcções. "Tuy obrigado? Puy obrigado?", brincava ela enquanto alguns berravam "MUITO"!


Ovação de pé, encore com Baby Birch, nova ovação de pé, satisfação geral. O meu primeiro concerto de 2011 não podia ter sido melhor escolhido.

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